Entrevista com o Biólogo Igor Cesarino
Fundada em 1981, a Sociedade de Botânica São Paulo (SBSP) é uma organização sem fins lucrativos, formada por pesquisadores, professores e estudantes de graduação e pós-graduação que se dedicam ao ensino e à pesquisa da Botânica em suas diferentes áreas, como a sistemática, filogenia e florística, bioquímica e fisiologia, ecologia e biogeografia.
Formada principalmente por Biólogos e Biólogas, a SBSP tem como missão promover a pesquisa e o ensino da Botânica como ciência, mostrar a importância das plantas para as pessoas, promover a pesquisa e o ensino da Botânica em seus diferentes níveis e divulgar por meio de cursos e eventos os avanços no conhecimento nas diferentes áreas da Botânica.
Nesse sentido, em entrevista ao CRBio-01, o Biólogo Igor Cesarino, presidente da SBSP cuja nova gestão se iniciou no último mês, conta de que forma a SBSP tem se adaptado às novas realidades a partir de propostas e estratégias de integração com a sociedade em geral.
CRBio-01 - Como têm se dado as atividades da SBSP nos últimos anos?
A SBSP foi fundada no início dos anos 1980 e, naquela época, as sociedades científicas tinham outra dinâmica, fazíamos muitos congressos regionais. Hoje em dia, exige-se congressos de impacto maior, de nível nacional ou internacional.
Os próprios objetivos dos eventos mudaram um pouco, pois os congressos serviam para conhecermos os mais novos trabalhos. Hoje, conseguimos publicar online first e todos têm acesso às novas pesquisas na internet. Há inclusive o que se chama de “pré-print”, quando primeiro se lança um artigo online na comunidade científica, com o objetivo de se ter um feedback de experts antes mesmo da submissão do artigo em publicações científicas.
Assim, as atividades foram ficando limitadas nos últimos anos. Por isso, temos iniciativa de trazer os botânicos mais próximos uns dos outros e dar uma nova cara ao que é ser sócio da SBSP.
CRBio-01 - Como é o desafio de estar na presidência da SBSP nesse contexto de modificações estruturais dos institutos de pesquisa, em especial com a Lei nº 17.293/2020, que trouxe a extinção do Instituto Florestal e a fusão do Instituto de Botânica com o Geológico?
A ciência como um todo tem sofrido ataques dos governos. Estamos vendo os investimentos em ciência e em pesquisa e os orçamentos de agências de pesquisa minguando, ficando cada vez menores. Mas o país que não investe em ciência não se desenvolve.
Fica um sentimento de que tudo isso é um movimento para sucatear os institutos de pesquisa e para viabilizar a privatização deles. Com isso, a percepção da população que não acompanha de perto as mudanças estruturais e só observa as instituições sucateadas é de que o problema é a administração pública; pensam que é melhor mesmo privatizar. Mas em qualquer lugar do mundo, o investimento em pesquisa é, em maior parte, público.
Estamos num momento de usar a divulgação científica em nosso favor. É importante que a população esteja do nosso lado para que o Brasil se desenvolva mais em termos de ciência.
Queremos, então, usar a Sociedade como instrumento para reunir os profissionais e pesquisadores, assim como fortalecer politicamente a Botânica, pois, nos unindo, poderemos evitar novos ataques.
Vamos buscar repaginar a SBSP, focando principalmente nos estudantes em formação, que trazem um gás novo às atividades. Por isso temos como prioridades, em termos de ação, a busca por mais sócios e o investimento em divulgação científica.
Assim, fortalecemos a colaboração com a ciência como um todo e com a própria Botânica em si. Temos que continuar com nosso trabalho de tentar fortalecer a ciência brasileira, batalhar para que o investimento em ciência aumente.
CRBio-01 - Quais são as estratégias pensadas para essa nova etapa?
Na Universidade de São Paulo (USP), há o Curso de Inverno de Botânica, que atrai estudantes de graduação do país todo. Estamos planejando para os próximos anos, então, expandir esse tipo tipo de iniciativa e, para isso, vamos lançar editais para financiarmos outros cursos em outros programas e em diferentes pólos do estado de São Paulo.
Queremos fortalecer essa dinâmica de atração de bons estudantes para a pesquisa e escutar ideias novas desses alunos. A própria vivência de cada aluno, que virão das mais diversas partes do Brasil, com suas diferentes perspectivas socioeconômicas, enriquecem o ambiente da Sociedade e nos ajuda a entender os problemas reais e a pensar projetos científicos e de extensão.
Temos também a intenção de diminuir o valor da anuidade para um valor simbólico para estimular o ingresso de estudantes em formação e para termos contribuição de pessoas jovens que podem trazer novas ideias, inclusive para atuação em projetos que contribuam diretamente com a sociedade.
Outra proposta é o investimento na divulgação científica, que é algo em que podemos trabalhar, pois traduz uma linguagem científica para a linguagem mais usual.
CRBio-01 - A missão da SBSP é muito contemplada pela editoração do periódico da Sociedade, The Brazilian Journal of Botany. Como funciona esse trabalho?
Um dos grandes objetivos das sociedades científicas é divulgar as grandes descobertas. Então a revista surgiu localmente para divulgação de dados de experimentos em todas as áreas da Botânica.
Qualquer pessoa que desenvolve um trabalho científico sobre Biologia vegetal pode submeter seu artigo, que, antes da publicação, passa pela avaliação do corpo editorial. Depois, os editores especializados na temática do artigo enviam o trabalho para os revisores anônimos.
O corpo editorial geralmente é composto por pessoas que fazem parte da Sociedade e a origem da SBSP está muito interligada à origem da revista, que é um patrimônio dela.
Mas todos podem submeter trabalhos para publicação, seja sócio ou não e vindo de qualquer país. A partir de 2013, a revista se tornou internacional e passou a ser publicada por uma das maiores editoras do mundo, a Springer Verlag Publishing.
CRBio-01 - De que forma os conhecimentos publicados na revista chegam à sociedade em geral?
A revista é disponibilizada online. No momento que estamos vivendo, é extremamente importante investirmos em divulgação científica. Estamos vendo um movimento negacionista à ciência. Então o cientista tem que se aproximar mais da sociedade.
Deve-se adotar, por exemplo, estratégias em redes sociais para traduzir a linguagem das descobertas técnicas, publicadas na revista, para uma linguagem acessível.
Queremos combater o que chamamos de “cegueira botânica”, que é o fato de que as plantas não são vistas pelo público em geral, que costumam identificar melhor os animais. Por isso é importante a divulgação de informações acessíveis sobre a Biologia vegetal.
CRBio-01 - Considerando o contexto atual, como os Biólogos e estudantes podem contar com a SBSP?
O Biólogo é um pouco carente em termos de oportunidade de emprego. Temos essa visão: ou você vai ser professor numa escola, ou vai ser pesquisador. Mas há uma série de possibilidades profissionais para os Biólogos e Biólogas.
Queremos promover a qualificação dos estudantes, expandir a oferta de cursos para que os interessados em Botânica, até para diminuir a cegueira botânica, que também ocorre entres os graduandos em Ciências Biológicas.
É importante que os estudantes conheçam todas as possibilidades que eles têm no mundo da Botânica. Para isso, é preciso conscientizar a todos sobre a importância da planta, que tem um relevante papel ecossistêmico, influenciando o ciclo de chuvas, as condições climáticas.
Hoje vemos essa forte pegada ambiental no mercado e o estímulo ao empreendedorismo. A questão da sustentabilidade está cada vez mais forte e isso é um caminho para os novos profissionais, conciliar empreendedorismo com sustentabilidade. Então sabemos que é importante estimular o desenvolvimento de produtos sustentáveis de bases vegetais.
Tudo o que fazemos traz impactos para o Meio Ambiente. Temos que pensar em maneiras de continuar nos desenvolvendo e reduzindo os impactos, até o impacto zero. Aumentar a produtividade das plantas em si, para produzir mais com menos espaço, menos água, menos fertilizantes.
De maneira alguma o desenvolvimento é inimigo da sustentabilidade. E os pesquisadores trabalham nesse sentido. A SBSP pode, inclusive, ser uma ponte para conectar profissionais e estudantes para iniciativas de empreendedorismo.
(Publicado em 04 de novembro de 2020)