Em meio à problemática dos incêndios no Pantanal, tem-se debatido sobre a questão da criação de gado na área territorial do bioma, com levantamento da tese de que o boi é o "bombeiro do Pantanal", alegando-se que, se houvesse mais gado no bioma, os incêndios poderiam ser menores do que os observados este ano.
Conhecida como tese do “boi bombeiro”, ela defende que o boi, ao comer uma parte da massa do capim seco, reduz o combustível dos grandes incêndios, pois, quanto mais alto o capim, maior e mais rápida a propagação dos focos de incêndio. Assim, argumenta-se que, estando o capim mais baixo após ser comido pelo boi, o fogo não se alastraria com tanta facilidade.
No entanto, a tese é rebatida por especialistas, que se baseiam em dados oficiais para demonstrar que ela se trata de uma falácia.
Este ano, o crescimento no número de queimadas fez o Pantanal perder cerca de 15% de sua cobertura vegetal, com destruição de pelo menos 2,3 milhões de hectares, segundo o Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo).
Esses incêndios que se alastram no bioma ocorrem num cenário em que, nos últimos 10 anos, a área de pastagem exótica cresceu 64% sobre áreas naturais e a criação de gado na região aumentou em 43% (Fonte: MapBiomas).
Além disso, apenas 4,6% do Pantanal está abrangido por unidades de conservação, de modo que as queimadas atingem principalmente áreas privadas, onde não há qualquer restrição legal para a criação de bois (Fonte: LASA - UFRJ, 2020).
Nesse contexto, os especialistas afirmam que, embora o gado criado solto ajude, de fato, a reduzir a quantidade de matéria-prima disponível para queima, não é a redução na pecuária que explica os incêndios deste ano.
Na realidade, um dos principais motivos para os incêndios é o clima: o Pantanal vive a pior seca dos últimos 60 anos, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).
É o que também aponta a Bióloga Paula Isla Martins, mestre em Biologia Vegetal pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. “Como principais fatores para os atuais incêndios no Pantanal, podemos apontar a seca extrema e as altas temperaturas. Além disso, não houve cheia este ano, então a ausência de áreas inundadas levou a um aumento das áreas suscetíveis às queimadas”, explica a Bióloga.
“Também existe a questão da sensação de impunidade em relação à prática de crimes ambientais, devido ao desmonte dos órgãos de fiscalização ambiental. Observamos também que este ano foram baixos os investimentos no trabalho de prevenção do fogo”, completa a Bióloga, que ressalta ser muito importante a conscientização sobre o Manejo Integrado do Fogo.
Essa técnica busca um equilíbrio entre diversos aspectos, com enfoque na conservação da biodiversidade e na proteção do clima, além de oferecer benefícios às comunidades locais. Assim, o Manejo Integrado do Fogo aborda, em linhas gerais, a análise de regimes do fogo apropriados para o ecossistema, a prevenção de incêndios, a preparação para o combate, o controle e a supressão de incêndios e a restauração.
“No caso do Pantanal, é essencial atentar para a época da queima, que deve ser realizada no período de chuvas ou no início da estação seca, para que o fogo não se espalhe tão rapidamente”, destaca Paula Martins, ressaltando que a técnica se aplica somente a locais já desmatados e em que há a criação de gado.