Biologia em pauta

Entrevista Juliana Pina: os impactos negativos do PL de licenciamento ambiental

Juliana Moreno Pina, Bióloga que trabalha com licenciamento ambiental e é conselheira do CRBio-01, analisa nessa entrevista os impactos no meio ambiente e no mercado de trabalho dos Biólogos do projeto de lei 3729/2004. A Câmara dos Deputados aprovou o PL, que flexibiliza e enfraquece as normas de licenciamento ambiental e está agora no Senado.

P: Qual é a sua avaliação geral sobre o PL?
R: Acho que o intuito inicial do projeto, apresentado em 2004, era desburocratizar e modernizar o licenciamento ambiental. De fato, a legislação é antiga e precisava ser atualizada. Ao longo da tramitação, o texto foi alterado, e o que era desburocratizar virou desobrigar. Do jeito que está, é difícil não pensar em um passa boiada.

P: O que mudou em relação ao projeto inicial?
R: Por exemplo, no projeto inicial, havia uma lista de tipos de empreendimentos que obrigatoriamente precisariam de licenciamento ambiental. No texto aprovado pela Câmara, a lista foi retirada. Além disso, foi incluída uma lista de atividade não sujeitas ao licenciamento. Ou seja, há o risco de que, a depender da área onde está prevista a implantação, ocorram impactos que não serão mitigados ou compensados, objetivo do licenciamento. Observa-se também que muitos dos procedimentos que antes eram o padrão, como a realização de levantamentos em campo para caracterização dos meios bióticos, físicos e sócio, se tornarão exceção.

P: Que outros aspectos do PL você destacaria?
R: O PL desobriga os empreendedores de apresentarem, no momento do licenciamento, certidões de órgãos que não fazem parte do Sistema Nacional do Meio Ambiente, por exemplo, as prefeituras. Então, um empreendedor pode conseguir a licença ambiental para construir uma fábrica ou até um aterro sanitário numa localidade onde isso não é permitido pela lei de zoneamento municipal.

P: Então será permitido instalar um aterro sanitário em qualquer local?
R: A prefeitura poderá impedir o empreendimento com base na lei municipal. Mas uma coisa é um município em São Paulo, que tem uma realidade bem diferente da do interior do país, da Amazônia, do Pantanal. Lá, os governos municipais são mais frágeis e muito mais suscetíveis a pressões dos empreendedores. Basta ver a destruição atual, mesmo com todas as exigências da legislação de hoje. Na prática, o pêndulo da negociação vai se inclinar ainda mais a favor de empreendimentos com grande impacto ambiental.

P: Será possível obter licenciamento para projetos que causam muita poluição e destruição da fauna e flora?
R: Hoje, para realizar um empreendimento com grande impacto ambiental, o empreendedor precisa apresentar um estudo de impacto ambiental (EIA) e obter licenças prévia, de instalação e de operação. O PL propõe que atividades com potencial de causar impacto ambiental significativo, como estações de tratamento de esgoto, ampliação de rodovias, aterros sanitários, entre outros, estejam dispensadas da análise de um EIA, e mais sério, do licenciamento.

P: A desobrigação do estudo de impacto ambiental vai impactar o mercado de trabalho dos Biólogos, certo?
R: Certamente. Em geral, esses estudos são feitos por Biólogos ou por equipes integradas por Biólogos. Eles vão a campo para levantar qual será o impacto que um empreendimento terá na fauna e flora. E depois, com frequência, ficam encarregados de monitorar as condicionantes exigidas pelos órgãos de licenciamento. Por exemplo, na construção de uma estrada, o órgão licenciador pode exigir que o empreiteiro faça túneis subterrâneos para a passagem de animais. Após a inauguração, o Biólogo ficará responsável por monitorar, por meio de câmeras, o fluxo dos animais. Todos esses postos de trabalho podem ser reduzidos ou desaparecer.

P: Por que tanto retrocesso?
R: Os empreendedores veem o licenciamento ambiental como um entrave, algo que impacta o custo e cronograma dos projetos. Mas o licenciamento é, na verdade, uma oportunidade para ouvir a população, aprimorar os projetos, torná-los sustentáveis e adaptados ao espírito da sociedade dos nossos dias, que não tolera mais a destruição ambiental.

(Publicado em 08 de junho de 2021)

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